Lei que sociedade exigiu, e Congresso finalmente votou, combina compromisso com qualidade com abertura à inovação. Mas a batalha decisiva está na implantação das políticas
Por Cleomar Manhas
Aprovou-se o Plano Nacional de Educação (PNE) depois de três anos e cinco meses de tramitação. Até onde nossa vista alcança, foi um projeto que recebeu intensa incidência política, fazendo história. Recebeu cerca de três mil emendas logo em sua primeira parada na Comissão Especial instalada na Câmara dos Deputados para sua análise.
Todas as organizações da sociedade civil voltadas ao tema da educação estiveram presentes e atuantes. Destaque para a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que brilhantemente conseguiu garantir em uma das metas o Custo Aluno-Qualidade, indicador que fará com que a União faça a complementação do Custo Aluno nos locais que não conseguirem atingir o valor mínimo. Destaque ainda para as organizações estudantis como UBES- União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e UNE- União Nacional dos Estudantes que lotaram os plenários e fizeram muito barulho bom de se ouvir.
Esta intensa mobilização, garantindo um processo de negociação com a participação de todos os agentes políticos e de todas as forças da sociedade responsabiliza, também, todos e todas com a aplicação e com o controle social do Plano, cada um com o seu papel. A nós, como sociedade, cabe fiscalizar, monitorar, incidir para que a sua implementação ocorra de forma a promover a educação como direito humano. É comum ouvirmos que mais dinheiro não garante uma boa gestão. Claro que não, mas é preciso mais dinheiro sim, e muito, pois em inúmeros lugares desse país gigante ainda estamos na idade da pedra lascada.
Em recente processo de formação do projeto Onda- Adolescentes em Movimento Pelos Direitos, desenvolvido pelo Inesc em escolas públicas, utilizando metodologia de pesquisa para que os estudantes ouvissem a comunidade escolar da qual participam, trabalhamos o tema educação de qualidade e o que motiva a sua não realização, como o número expressivo de adolescentes que abandonam a escola no ensino médio, ou antes mesmo de acessá-lo.
A impressão geral, coletada pela pesquisa, é que as escolas são pouco atraentes e, em geral, não ouvem o seu público. E apesar de acharem a escola pouco sedutora, a boa surpresa é que gostam dessa instituição, especialmente das públicas, por as julgarem mais democráticas que as privadas. No entanto, gostariam de vê-las equipadas a contento e voltadas para um mundo próximo daquele onde vivem e de acordo com o momento que o vivenciam.
Outra questão constatada, que reforça a impressão de que parlamentares estão distantes da sociedade, é que motivos fortes da evasão escolar ancoram-se nas desigualdades de gênero, de orientação sexual e de raça. E apesar disso, retiraram do PNE a possibilidade de se enfatizar o enfrentamento a essas desigualdades e amadurecer o processo educacional como acolhedor de todas as diferenças. Infelizmente vivemos um momento de grande obscurantismo e retrocessos conservadores.
Contudo, mesmo com percalços e perdas ao longo da estrada, o balanço é positivo e este é o melhor Plano Nacional de Educação que já tivemos. Além de nos municiar de elementos para recrudescermos a velha batalha por educação de qualidade. E as aves agourentas podem dizer que isso é chavão, que os movimentos voltados à educação dizem ser esta política uma panaceia, mas verdade seja dita, é isso mesmo, educação de qualidade não resolve tudo, mas muda tudo. Muda a forma de as pessoas verem o mundo, dá a elas liberdade e independência de pensamento, promove-as.
E o PNE trata de reestruturação das redes municipais e estaduais, o que implica na qualificação dos profissionais de educação e melhora salarial, equalizando seus salários com o dos profissionais com o mesmo nível de formação. Espera-se que a União faça valer o artigo 211 da Constituição e não fuja à responsabilidade de garantir padrões mínimos de qualidade. No entanto, os municípios e estados da mesma forma devem priorizar a educação, visto que a vida real acontece no solo das cidades e não na abstrata “União”.
O PNE aborda de questões importantes e menos priorizadas pelos sistemas que é a Educação de Jovens e Adultos e o enfrentamento ao analfabetismo. É preciso políticas transformadoras desta realidade de profunda violação de direitos, que são os inúmeros analfabetos funcionais e totais que temos. As pessoas precisam ser promovidas e libertadas da pedra lascada.
A ampliação da oferta de creches públicas é, também, uma política da maior importância e deve sempre estar na área da educação, para que faça parte do processo educacional e não seja apenas uma oferenda assistencialista. Esperamos que desta vez a oferta seja mais coerente com a demanda que é enorme, especialmente, nos bairros periféricos das grandes cidades.
E vamos ao nosso papel de sociedade, a participação em todas as instâncias. Apesar de alguns críticos dizerem que temos conselhos demais, nosso nível de participação ainda está muito aquém do necessário, precisamos que a comunidade escolar de fato seja comunidade, que os pais estejam presentes no cotidiano de seus filhos e filhas e, que além de fiscalizar se as metas estão sendo atingidas, contribuamos para a democratização das escolas. Pelo fim das instituições totais e a favor do compartilhamento.
Com informações do Outras Palavras
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