Ex-delegado do DOPS confessa como eram assassinados os militantes da esquerda durante a Ditadura
Realizado sob o pretexto de garantir a
democracia e salvar o Brasil do “fantasma do comunismo”, o golpe militar
de 1964 impôs a mais ferrenha ditadura aos trabalhadores e ao povo
brasileiro. Nesse período, milhares de comunistas e democratas foram
presos, entidades estudantis fechadas, universidades invadidas pela
polícia, sindicatos sofreram intervenção, parlamentares tiveram seus
mandatos cassados, a imprensa foi censurada e greves foram proibidas.
A face mais brutal da Ditadura,
entretanto, foi a tortura e o assassinato de seus opositores, homens e
mulheres que lutaram bravamente pela liberdade e pelo socialismo em
nosso país e que, por isso mesmo, são e sempre serão lembrados como
verdadeiros heróis do povo brasileiro.
Essa semana um dos responsáveis por
perseguir, prender, torturar e assassinar esses patriotas saiu da
escuridão. O livro “Memórias de uma guerra suja”, que será lançado esse
fim de semana, reúne uma série de depoimentos dados aos jornalistas
Marcelo Netto e Rogério Medeiros pelo ex-delegado do DOPS (Departamento
de Operações Políticas e Sociais) do Espírito Santo, Cláudio Antônio
Guerra, trazendo à luz revelações importantes e históricas sobre os
crimes praticados durante a Ditadura Militar no Brasil.
Guerra, que substituiu o monstro
fascista Sérgio Paranhos Fleury à frente do DOPS após sua morte, dá
nomes aos envolvidos nesses crimes e afirma ter sido um dos principais
encarregados pelo regime de matar adversários da Ditadura entre os anos
70 e 80, tendo participado pessoalmente no assassinato de
aproximadamente uma centena de pessoas durante o período, inclusive do
próprio Fleury.
No livro, o ex-delegado do DOPS, que
(acreditem!!!) se diz arrependido, conta como executou pessoalmente
militantes de esquerda como Nestor Veras, então membro do Comitê Central
do Partido Comunista Brasileiro (PCB), após uma sessão de tortura:
“(Veras) tinha sido muito torturado e estava agonizando. Eu lhe dei o
tiro de misericórdia, na verdade dois: um no peito e outro na cabeça.
Estava preso na Delegacia de Furtos em Belo Horizonte. Após tirá-lo de
lá, o levamos para uma mata e demos os tiros. Foi enterrado por nós”.
Guerra diz também que pelo menos dez
corpos de militantes assassinados sob tortura foram incinerados no forno
da Usina Cambahyba, de propriedade do ex-deputado federal e
ex-vice-governador do Rio de Janeiro Heli Ribeiro Gomes, colaborador da
Ditadura, em 1973. Segundo o ex-delegado, foram incinerados os corpos de
João Batista e Joaquim Pires Cerveira (presos na Argentina pela equipe
do delegado Fleury), Ana Rosa Kucinski e Wilson Silva (“a mulher
apresentava marcas de mordidas pelo corpo, talvez por ter sido
violentada sexualmente, e o jovem não tinha as unhas da mão direita”),
David Capistrano (“lhe haviam arrancado a mão direita”), João Massena
Mello, José Roman e Luiz Ignácio Maranhão Filho (dirigentes históricos
do PCB), Eduardo Collier Filho (militante da Ação Popular
Marxista-Leninista) e Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira (ver A Verdade, nº 8).
De acordo com os depoimentos do livro,
os comandantes desse tipo de operação eram o coronel do Exército Ênio
Pimentel da Silveira, conhecido como “Doutor Ney”, o coronel-aviador
Juarez de Deus Gomes da Silva, da Divisão de Segurança e Informações do
Ministério da Justiça, o delegado da Polícia Civil de São Paulo
Aparecido Laertes Calandra, o coronel do Exército Freddie Perdigão, do
Serviço Nacional de Informações (SNI), o comandante Antônio Vieira, do
Cenimar, e o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, comandante do
Departamento de Operações de Informações do 2º Exército (DOI-Codi) e
notório torturador.
Essas e outras revelações feitas pelo
ex-delegado Cláudio Guerra apenas reforçam a necessidade de que a
Comissão Nacional da Verdade, que está preste a ser nomeada pela
presidenta Dilma Rousseff, deve cumprir com a tarefa de lançar uma luz
sobre a nossa história, permitindo efetivamente que se conheça o que
ocorreu nos vinte e um anos de ditadura, identificar os responsáveis e
fazer justiça. Não é justo que enquanto centenas de famílias permanecem
sem saber como morreram e que fim levaram os corpos de seus entes
queridos, criminosos e torturadores confessos continuem impunes,
circulando livremente pelas ruas e pelas instâncias de poder do país,
muitos deles sendo tratados, inclusive, como homens honrados. É preciso
que a justiça seja feita, os crimes da Ditadura apurados e seus
responsáveis devidamente punidos. Está na hora do Brasil abrir essa
caixa preta e reescrever sua própria história.
Por Heron Barroso no A VerdadeLeia também: Operação Condor, um antro de criminosos
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