Ao vestir a faixa presidencial, a partir de 1º de janeiro, Dilma Rousseff sucederá um líder popular como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e enfrentará as expectativas habitualmente projetadas sobre cada novo chefe do Executivo. Entre os senadores, espera-se que ela enfrente logo de cara o desafio de fazer as reformas política, tributária e previdenciária.
Grosso modo, na questão tributária o debate gira em torno da necessidade de um sistema tributário mais simples e menos oneroso para o setor produtivo, essencial à competitividade do país. O envelhecimento da população e a pressão que isso exercerá sobre as contas de aposentadoria é o desafio mais atual da Previdência. Há ainda a velha polêmica sobre o déficit corrente cuja existência é contestada por sindicalistas e até setores do governo, mas que outras fontes sustentam ser uma grave realidade, com a indicação de que o rombo na Previdência pode chegar a R$ 37 bilhões ao fim de 2010.
Quanto ao sistema político, o que se buscam são caminhos para fortalecer os partidos e a representação popular, para impedir as legendas de aluguel e para reduzir os custos dos processos eleitorais. Os remédios sugeridos vão desde o financiamento público de campanha até o voto distrital, além do estabelecimento de cláusula de barreira para admissão de partidos nas casas parlamentares e a adoção, por lei, da fidelidade partidária.
Esses temas foram exaustivamente debatidos nos últimos anos, havendo uma boa dose de consenso em torno de diagnósticos, mas gritantes divergências com relação às medidas que devem ser adotadas. Eleita com 55 milhões de votos, a primeira mulher presidente do Brasil chega agora ao poder reacendendo as esperanças de que poderá liderar a agenda reformista com mais êxito que seus antecessores mais imediatos, o presidente Lula, seu mentor político, e Fernando Henrique Cardoso.
- O país precisa desatrelar-se de estruturas já superadas, que o prendem e impedem um desenvolvimento mais forte e harmônico. Só as reformas possibilitarão um crescimento compatível com as potencialidades do país - afirma Alvaro Dias (PR), líder do PSDB.
Força da maioria
Eleita por uma coligação de dez partidos e ainda com o apoio de líderes de outras legendas, Dilma Roussef chega ao posto mais alto do país com forte maioria na Câmara dos Deputados e no Senado. Para a oposição, essa circunstância confere força inédita à nova presidente no jogo político-parlamentar e favorece amplamente o projeto das reformas. É um reconhecimento e também uma cobrança.
- Dilma só não fará as reformas se não quiser. No Senado, contará com um rolo compressor e, na Câmara, com uma maioria fantástica. Talvez nenhum presidente da República tenha tido tanta chance como ela tem agora - avalia Heráclito Fortes (DEM-PI).
A tese das reformas encontra igual apelo entre senadores da coligação que garantiu a vitória de Dilma. No entanto, para a situação, a força política da nova presidente no Congresso é uma vantagem apenas relativa, em face das dificuldades trazidas pelos temas, associados a interesses muito divergentes.
- Sair com uma base ampla desde a eleição facilita o diálogo interno naquilo que é crucial, mas não é tudo. A base é muito heterogênea - observa um aliado, o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE).
Na avaliação de Inácio Arruda, as maiores dificuldades vão se manifestar no debate da reforma tributária. Antes de qualquer coisa, salientou, a presidente terá que construir maioria dentro da própria base e depois "puxar" parcelas da oposição que representam estados com interesse comuns.
Integrantes da oposição confirmam que há de fato campo para entendimento com o governo. Da linha adversária, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) avalia que o momento é propício para a agenda das reformas e concorda que o país pode caminhar nessa direção sob a liderança de Dilma.
- Se abraçar as reformas, a presidente encontrará na oposição muita gente disposta a colaborar com o debate; não para fazer o que ela quiser, mas para discutir e buscar consensos que possam levar o Brasil adiante - ressalvou Demóstenes.
Outros senadores não acreditam na possibilidade de decisões consensuais em torno das mudanças desejadas. É o caso da senadora Ideli Salvatti (PT-SC), que a partir de janeiro estará na equipe de Dilma, como titular do Ministério da Pesca, e também de Alvaro Dias, o líder tucano. Para os dois, temas cruciais das reformas política e tributária acabarão decididos na contagem de votos.
Agenda parlamentar
Ideli Salvatti considera correta a expectativa de que partirá do futuro governo a iniciativa do debate sobre eventuais mudanças nos sistemas tributário e previdenciário. Porém, em relação à reforma política, assim como Inácio Arruda, ela diz se tratar de uma agenda parlamentar.
- Essa é uma questão dos partidos e do Congresso - reforça Ideli.
Para outros senadores, porém, a nova presidente deve destinar à reforma política tanta ou maior atenção quanto a que será dada às demais, independentemente de quem seja o iniciador da sua modelagem. O envolvimento direto da própria Dilma nas tratativas é considerado uma condição para o bom andamento dessa reforma. A medida desse esforço seria proporcional à força desfrutada pelo Executivo no sistema republicano que vigora no país.
- É quase um regime imperial, não vamos ser hipócritas. O Executivo controla o Legislativo e até penetra na seara do Judiciário - comenta Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR).
Uma boa reforma nas regras eleitorais e no modelo de organização dos partidos se converterá em ganhos para a governabilidade, como avaliam diversos senadores.
- Podemos considerar a reforma política como a 'mãe de todas as reformas'. Depois dela, será mais fácil realizar as demais - acredita o senador Pedro Simon (PMDB-RS).
Em reforço, a senadora Marina Silva (PV-AC) avalia que reforma política será mesmo a oportunidade de limpar terreno para o país avançar institucionalmente em suas grandes questões. Como afirma, sem ficar "refém de interesses menores e do discurso de conveniência".
Gorette Brandão / Agência Senado
do Página64
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