11 de julho de 2011

No Brasil, esquerdas aumentam suas críticas ao governo Dilma


Democratização das Comunicações (#DemoCom)? Nem pensar: PNBL deve ser entendido em conjunto com os demais retrocessos de Dilma

Por Raphael Tsavkko Garcia no  Blog do Tsavkko - The Angry Brazilian

É preciso entender o PNBL como resultado dos inúmeros retrocessos patrocinados pelo governo Dilma, comprovando que esperar alguma reforma séria nos meios de comunicação, sua democratização, ou mesmo a ampliação do acesso do povo à informação (via internet ou qualquer outro meio) é esperar pelo impossível.

A surpresa (ironia) pós-anúncio do pífio PNBL foi o apoio dado por vários blogueiros petistas/progressistas a tamanho absurdo.

"É o possível", "estamos em ano de ajustes", "com Serra seria pior", "é o que a conjuntura permite", "querem depor a presidenta" "se Dilma vai mais além a direita a derruba" e outras besteiras do tipo usadas sempre que surge alguma crítica à timidez (não, covardia mesmo) do governo em impor uma agenda séria ao país.

Vejam só o absurdo:
"A limitação de downloads preserva os pacotes atuais das operadoras, para que não haja concorrência com o novo produto, mais barato", diz Eduardo Tude, consultor e presidente da Teleco. "Para consultar e-mails, 300 MB devem ser suficientes."

Pois é, é "suficiente" pra consultar e-mails, afinal, TODA a experiência da internet se resume a isso, ou melhor, pra pobre, só isso basta. É o cúmulo do preconceito. E, obviamente, a lenda do investimento em tecnologia e ampliação da rede é apenas isso, lenda. O PNBL é este lixo para não afetar o já péssimo serviço prestado pelas teles, enfim, será usado o pouco espaço ocioso e no máximo uma ou outra ampliação será feita, mas tudo estudado para ficar nos padrões mínimos (nem o governo exigiu mais que isso, abrindo mão por nós da qualidade).

Lula tinha mais de 80% de aprovação e usavam a mesma desculpa. Mensalão foi a desculpa perfeita para recuar e não magoar os mercados, os empresários amigos e os banqueiros companheiros. Com um estalar de dedos, Lula poderia ter feito mudanças profundas no país apenas com a força de sua pessoa e com o apoio do povo. Mas não fez.

Deixou promessas e projetos para Dilma. Abertura dos Arquivos, PNDH3 desenhado por Vanucchi e outros, projeto de Ley de Medios rascunhado por Franklin Martins - que efetivamente queria colocar regras no setor -, promessa de um PNBL estatal e popular (a velocidade inicial era baixa, mas estávamos discutindo mil possibilidades dentro de um marco público), uma evolução de décadas em 8 anos na área da cultura com diversos projetos a serem implementados, Marco Civil, Reforma da Lei de direitos autorais e por aí vai...

Chegou Dilma e todas as promessas, todos os projetos foram enterrados, jogados no lixo ou mesmo revertidos. Marco civil enterrado e AI5Digital mais vivo que nunca, Reforma da LDA definitivamente abandonada por uma Ministra que é amiga do ECAD e das gravadoras e busca criminalizar o que compartilha e produz cultura, PNDH3 é lenda, abertura dos arquivos não sairá e ainda teremos sigilo eterno reforçado, Ley de Medios não sairá jamais e o PNBL nem precisa comentar.

Covardia, falta de comprometimento, venda de bandeiras, safadeza pura mesmo.

Engraçado que ao mesmo tempo estes apoiadores deste PNBL ridículo não estão reclamando do absurdo da fusão do Pão de Açucar com o Carrefour, feito com dinheiro NOSSO via BNDES! Vejamos, dar banda larga para o povo dentro de um modelo estatal, o que acabaria forçando as teles a prestar um serviço melhor devido à concorrência e a baixar preços não dá, mas enfiar nosso dinheiro para garantir um oligopólio num setor que já vem sofrendo com altíssimos e inexplicáveis preços tá ok?

Peitar congresso de direita não, peitar o povo sim? Prejudicar abertamente o povo pode?

E o salário mínimo que muitos destes que agora apoiam este PNBL diziam ser o possível? Não tem dinheiro pra salário nem pra PNBL mas tem pra Belo Monte (passando por cima de decisão da Comissão Interamericana de direitos humanos), pra Transposição do São Francisco, pra Trem Bala (infinitas vezes mais caro que em qualquer outra parte do mundo) e pra ajudar empresa privada a comprar outra (Pão de Açucar e Carrefour)?

O que parecem não notar é que o governo tem prioridades. E estas são as de agradar o mercado e impor seu neo-desenvolvimentismo a todo custo. É o Pão e Circo revisitado e piorado. Você mantém o Bolsa Família que se limita a entregar dinheiro ao povo (que emergencialmente faz sentido, mas não eternamente) sem que junto a isto venha capacitação, inclusão ou educação.

Em termos de educação você abandona o ensino básico e cria o ProUni que faz TODO sentido enquanto incentivo à universidades de QUALIDADE, mas que acabou servindo como última salvação às UniEsquinas, que vem montando verdadeiros impérios sem qualquer qualidade ou respeito pelo aluno.

E, passado o Pão, vem o Circo, de qualidade igualmente duvidosa, com um PNBL pífio, com um Vale Cultura igualmente pífio (vide todo o trabalho de Ana de Hollanda no MinC - para destruí-lo) atrelado ao aumento irrisório do Salário Mínimo que impede o trabalhador - que já tem uma carga de trabalho escorchante e quase nenhum tempo livre com luz do sol - de aproveitar qualquer opção cultural digna em cidades cada vez mais caras, desiguais e gigantescas.

Não surpreende que, apesar de todos os inúmeros e até incontáveis recuos o PNBL venha servindo como divisor de águas pra muitos. Era a galinha dos ovos de ouro, a esperança de um pouco de dignidade depois dos gays terem sido rifados para dar lugar aos crentes, do MST, nossas matas e Reforma agrária terem sido rifadas em nome dos latifundiários do Aldo Rebelo, da política externa independente anterior ter sido modificada para agradar aos EUA - até presos políticos fizemos para Obama!

Esperança que se provou inútil.

Não há até o momento NENHUMA área em que o governo não tenha recuado vergonhosamente frente à Lula (que já colecionava falhas e erros) e frente à história e à dignidade dos brasileiros. Aliás, minto, não houve recuo no Bolsa Família, mas pelas razões já explicadas acima, a de garantir um fluxo de eleitores fiéis, pegos pela boca e pelo bolso (o que quase não funcionou durante a eleição de Dilma, pois o conservadorismo falou mais alto em muitos casos).

Enfim, o PNBL foi a gota d'água para muitos e até mesmo para mim que, apesar das críticas, ainda nutria vãs esperanças neste governo, que ele acordaria. De que o governo passaria a compreender a internet como uma ferramenta de emancipação. Mas assim como outros passo à oposição dura, de esquerda, socialista, sem mais contemporizar ou aceitar tantos recuos vergonhosos e tanto desrespeito contra o povo.

Dentro deste cenário o que esperar do projeto-quase-lenda de Franklin Martins sobre a democratização dos meios de comunicação? Se o governo é incapaz sequer de peitar os Marginais da Fé e garantir o respeito aos direitos da comunidade LGBT, como sonhar que irão peitar minimamente os interesses da grande mídia? Não irão.

Se sobrar alguma coisa do projeto de democratização dos meios de comunicação (Ley de Medios) será semelhante às propostas pífias de mudança do PLC122, que basicamente não protegem nada nem ninguém ou mesmo algo semelhante ao PNBL, apenas cosmético e ruim.
Raphael Tsavkko Garcia
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Global Voices Online (author and translator)
Colunista do Diário Liberdade - "Defenderei a casa de meu pai"
Trezentos / Latin American Bureau (LAB)
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