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| Ciep Luiz Carlos Prestes - Cidade de Deus | 
A Professora Amanda Gurgel que, semanas atrás, em vídeo postado no youtube emocionou os brasileiros com seu desabafo pleno de consciência cidadã, impressionou pela objetividade desconcertante com que apontou os problemas crônicos que assolam a educação pública em nosso país. Ela só errou ao generalizar na afirmação de que nenhum governo em nenhum estado jamais priorizou a Educação no Brasil.
Para que a verdade seja restabelecida, é necessário esclarecer que  houve, sim, no Rio de Janeiro, um governo que priorizou a Educação.
Em 1983, com a posse de Leonel Brizola como primeiro governador  eleito depois da ditadura militar, foi desenvolvido o Programa Especial  de Educação, materializado nos Centros Integrados de Educação Pública,  os Cieps, com a coordenação do Prof. Darcy Ribeiro.
Sob inspiração do mestre Anísio Teixeira, a equipe organizada por  Darcy Ribeiro formatou os Cieps. Eram escolas com horário integral,  aulas de reposição, biblioteca, esportes,  atividades de  cultura a cargo dos animadores culturais. As crianças faziam quatro  refeições diárias e tomavam banho antes da volta para casa. Os Cieps  tinham ainda residência para vinte crianças carentes, com pais  substitutos.
Nos prédios havia cozinha industrial, gabinete médico-odontológico,  quadra de esportes e, alguns, piscina. Os professores tinham programas  de atualização, formação continuada e os materiais pedagógico e didático  eram da melhor qualidade. As merendeiras eram concursadas e passavam  por treinamento antes de assumir. As turmas tinham 20 crianças nas  séries iniciais e até, no máximo, 30 nas turmas de 5ª a 8ª séries.
Muitos Cieps tornaram-se ponto de convergência das comunidades em  que estavam localizados e nos finais de semana havia atividades de  entretenimento para os alunos e seus familiares. Em muitas unidades,  festas de casamento, quinze anos, batizados, posse de associações de  moradores e outros eventos aconteciam em suas dependências. Era o início  do conceito difundido hoje em todo o país como “escolas de paz”.
O projeto era tão avançado que imediatamente gerou um ódio  irracional em setores da grande imprensa e em segmentos da sociedade  que, inconformados com todo aquele investimento em educação pública,  começaram uma campanha mesquinha, contínua, incansável para desacreditar  os Cieps junto à população.
O ódio era tanto que houve quem falasse e escrevesse - sem o menor  pudor - editoriais, colunas e cartas acusando os Cieps de serem caros  demais; que escola não precisava de prédio especial; que escola podia  funcionar em qualquer lugar, até embaixo de uma árvore; que escola não  era hotel; que escola não era restaurante; que os alunos dos Cieps eram  marginais; que crianças pobres não podiam estudar em horário integral,  pois tinham que trabalhar para ajudar os pais, e outros absurdos mais.
Nesse período, o governo Leonel Brizola investiu também na melhoria  salarial do magistério, aprovando um plano de carreira que partia de  três salários mínimos e meio (R$ 1907,50 em valores atuais), dividido em  nove níveis, com 12% de acréscimo entre os níveis, o que significaria,  hoje, um salário de R$ 4.722,90, no nível 9. O salário inicial de um  professor com curso superior (nível 3) seria de R$ 2.392,77 em valores  de hoje. Some-se a isso o valor dos triênios, 5% a cada três anos, com o  máximo de 60%. Portanto, início e final de carreira dignos.
Na época não havia reeleição. O Prof. Darcy Ribeiro, candidato à  sucessão de Leonel Brizola, perdeu as eleições para Moreira Franco.  Empossado, Moreira não perdeu tempo: extinguiu o Programa Especial de  Educação e desmantelou os Cieps. Muitos viraram sedes de juizados,  batalhões, prefeituras no interior. Houve um que, abandonado, chegou a  abrigar um estábulo da Polícia Militar.
Quando Leonel Brizola assumiu o governo novamente em 1991, retomou o  Programa e concluiu a construção dos 500 Cieps previstos no primeiro  governo.
Eu tive a honra de integrar a equipe do Prof. Darcy Ribeiro. 
Pude então testemunhar a campanha odiosa de setores da imprensa  contra o projeto. Todos os dias saíam matérias que diziam que a obra não  ficaria pronta para o carnaval de 1984. Se ficasse, a estrutura  desabaria. Se não desabasse, não iria funcionar como escola. Se  funcionasse, não teria horário integral.
A cada vaticínio, a resposta vinha com o cumprimento do cronograma de cada nova etapa do projeto. 
Ao assumir o governo em 1995, Marcello Alencar, que deixara o PDT  que fundara ao lado de Brizola e ingressara no PSDB, deu as costas à sua  própria história e, a exemplo de Moreira Franco, além de promover a  destruição dos Cieps, ignorou o plano de carreira, impondo aos  professores fluminenses uma perda salarial da qual, passados dezessete  anos, ainda não conseguimos nos recuperar, apesar da vitória na Justiça,  em 2001, da ação movida pela União dos Professores Públicos no Estado -  Uppes contra o governo fluminense.
Lamentavelmente, nos dois momentos em que os Cieps foram atacados de  forma vil, a sociedade não estava organizada o suficiente para defender  essa conquista e os professores, divididos por disputas  político-partidárias, foram incapazes de se unir para evitar a  derrocada.
Para mim, o maior crime praticado contra a população por esses maus  governantes foi não terem permitido a nenhuma geração se formar  pelos Cieps. E isto ainda hoje me dói, é um fato que não consigo  aceitar. Tal violência deveria ser considerada crime de lesa-humanidade e  seus autores levados a um tribunal para sentarem-se no banco dos réus. A  esses, espero, resta ainda o julgamento da História.
À jovem Profª Amanda Gurgel, que renova nossas esperanças nesta  profissão por  sua consciência do que deveria ser a bandeira maior  de uma sociedade em desenvolvimento, posso hoje dizer que, apesar dessa  derrota, a causa não foi totalmente perdida porque o sonho que vivemos  no Rio de Janeiro com Leonel Brizola e Darcy Ribeiro se disseminou pelo  país.
Hoje, horário integral e escola digna são pauta de qualquer partido  político. Até o mais reacionário representante do mais conservador  partido brasileiro não tem coragem de se colocar contrário a esse modelo  de escola. Pelo menos não mais em público como há 28 anos.
do Instituto João Goulart
Parabens pelo Artigo. Sim, Artigo com "A" maiúsculo. Lembrando também que o Sambódromo é um CIEP. Ou foi, não sei. Hoje estou vivendo fora do Rio.
ResponderExcluirAbraços,
Luis Celso
Luis Celso Lula dos Santos, também escutei que ou iriam acabar com as escolas do Sambódromo ou que já teriam acabado. O projeto do Sambódromo foi imitado em vários outros estados e era como tudo o que o Brizola fez no RJ, muito bom. Foi Leonel de Moura Brizola quem me despertou o interesse pela política.
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